Transcrição da fala de Magda Moreira, moradora da Comunidade Souza Ramos na Assembleia Legislativa De São Paulo
A fala da Magda Moreira Na Reunião Da Assembleia Legislativa De São Paulo [ALESP] 16 e Outubro
Magda: Obrigada, boa noite.
Estou um pouquinho nervosa, porque geralmente eu não falo publicamente dessa forma, então vou tentar ser o mais breve possível por conta do tempo também.
Agradecer a todo mundo que está presente aqui.
Agradecer mais uma vez ao Marco Martins, por ter abraçado a causa inicialmente comigo, porque eu fui a moradora que tentou mover inicialmente, ter alguma ação referente a essa obra, porque a gente estava vendo esse crime acontecer da janela das nossas casas e com total falta de transparência por parte da prefeitura; porque você entra no projeto, você vai no site da prefeitura e eles omitem a informação de número de famílias, eles dizem que estamos sendo cadastrados em projetos de habitação social, o que não é verdade.
Eu quero pontuar isso aqui.
A prefeitura nunca entrou em contato com ninguém da comunidade Souza Ramos ou da Luiz Alves. Então, só para deixar bem claro isso aqui. A prefeitura não entrou em contato.
E eu queria ler um texto que eu fiz para falar no dia da audiência, que foi cancelada e até então não foi reagendada, que tinha sido para acontecer na subprefeitura da Vila Mariana.
Então, eu não renovei meu texto. Eu menciono até pessoas que não estão aqui hoje, mas eu vou só ler o que está escrito para que vocês relembrem que também não é só a questão ambiental, é um crime higienista social e ambiental, porque é muita coincidência esse túnel... quererem que passe numa comunidade e que é reconhecida pela prefeitura, se você puder me corrigir, desde o ano de 1949, ou seja, 75 anos que fomos reconhecidos como uma comunidade, e que agora, em 2024, a gente está sendo totalmente negligenciado por todas as partes envolvidas nesse projeto criminoso.
Obrigada, novamente.
Vou ler o meu texto.
Eu moro há 25 anos nesse lugar no qual querem tornar um túnel. Eu nasci, cresci e fui criada ali. Nasci no bairro, estudei nas escolas do bairro, utilizei postos de saúde e hospitais do bairro a minha vida inteira também.
Mas a Sousa Ramos não carrega com ela somente a minha história. Ela carrega a história de mais de 200 famílias, sejam as que permanecem até os dias de hoje, como todas as outras que por ali também passaram.
Essa obra se tornou um pesadelo na vida de todas essas famílias. Nos sentimos desrespeitados, negligenciados e abusados por todas as partes envolvidas nessa história. Do dia para a noite, havia tratores, caminhões, equipes de obra e governantes falando sobre, em rede nacional, sobre esse projeto de túnel que impacta negativamente uma comunidade inteira, que sequer foi informada, instruída ou orientada sobre essa obra.
Nós moramos onde decidiram que querem passar esse túnel e não recebemos nenhum representante por parte da prefeitura, construtora ou pessoas envolvidas no projeto.
Estamos falando de famílias inteiras, crianças, idosos, deficientes, pessoas em fase de tratamento médico, sendo noticiadas, através de propostas de candidaturas políticas e debates em rede nacional, que poderíamos perder as nossas casas.
Pessoas essas que têm as suas vidas estruturadas no bairro há gerações, que não querem se ver obrigadas a recomeçar suas vidas do zero em outro lugar por decisão de terceiros, que não querem colocar os seus empregos em risco ou tirar as suas crianças das suas respectivas escolas.
Alguns de nós também se encontram em tratamento de câncer ou sem condições de pagar um aluguel se perderem as suas casas próprias.
Muitas dessas aonde há apenas um provedor por família, ou seja, é apenas um salário mínimo e isso é desesperador.
A cidade de São Paulo já sofre com um problema sério de pessoas em situação de rua. Então, o questionamento que fica ao atual prefeito Ricardo Nunes e ao vereador Aurélio Nomura, que se nomeia pai da obra, graças a Deus não foi reeleito, e às construtoras envolvidas no projeto é:
Qual é a proposta da prefeitura para o problema de pessoas em situação de rua que essa cidade já tem? Seria a solução correta gerar ainda mais pessoas nessa situação?
Acredito que seja muito fácil fazer marketing desse projeto para campanhas políticas, não mencionando os danos ambientais e sociais que nele se envolvem. Porque para todos é muito claro esse crime higienista do qual estamos discutindo aqui no dia de hoje.
Os candidatos mencionados por mim anteriormente nos mostram que - a sua opinião é que uma zona ZEIS parece ser inaceitável em um bairro como a Vila Mariana e que a construção de habitação de interesse social no bairro também, já que a lei estabelece claramente que pessoas dessa situação sejam realocadas para projetos de HIS [Habitação de Interesse Social] até 1,5 km de distância da sua moradia anterior e que parecem claramente não estar nos planos desse projeto.
A lei decreta que os planos de ações, ocupados por população de baixa renda, devem ser formulados preferencialmente pelo executivo com participação direta de seus respectivos moradores e conselhos gestores, destinado ao reassentamento dessas famílias de baixa renda e as condições de estabilidade, segurança e salubridade.
O direito à moradia se tornou um direito humano universal, aplicável em todas as partes do mundo como um dos direitos fundamentais para a vida das pessoas, e isso foi no ano de 1948. Ou seja, fomos reconhecidos como comunidade um ano após na ONU ter aplicado esse direito humano universal.
O direito à moradia não se resume apenas a um teto e quatro paredes, mas é o direito de toda pessoa ter acesso a um lar e uma comunidade segura para se viver em paz, com dignidade e com saúde física e mental. Nós temos direito à moradia e auxílio aluguel de 400...
(Calma, desculpa, me perdi.)
Nós temos direito à moradia e a um auxílio aluguel de 400 reais que não queremos, porque isso não nos dará acesso a nenhum tipo de moradia em nenhuma favela do Estado de São Paulo. Com 400 reais você não consegue fazer mercado mensal. Imagina pagar por uma moradia? Isso é loucura!
Essas pessoas aqui presentes para fazer oposição à nossa existência são pessoas de classes sociais completamente diferentes à nossa e que associam a pobreza ao perigo, que têm aversão a se imaginar vivendo no mesmo lugar que pessoas com uma renda menor que a delas, que vivem com uma falta de compreensão em relação às dificuldades enfrentadas por essas pessoas em situação de pobreza e que difundem a imagem de pobres como preguiçosos, desonestos, como se responsáveis pela sua própria condição. Essas pessoas não conseguem se identificar com as nossas lutas e os desafios que pessoas como eu enfrentam.
Enquanto a maior parte da criminalidade, certamente mais perigosa do sistema, não procede dos setores empobrecidos da população, mas sim de máfias bem organizadas que controlam uma imensa quantidade de dinheiro, inclusive essas construtoras envolvidas nesse projeto criminoso.
Essa situação da qual a minha comunidade vive agora é displicente e inadmissível. Estamos vivendo aqui um crime ambiental e higienista social escancarado sendo cometido. Exigimos por nossos direitos e clamamos por ajuda.
Eu não admito que me tirem da casa que o meu pai construiu com o suor de muitos anos de trabalho e de muita luta como motorista de ônibus por 40 anos. É a única coisa que a minha família tem e que agora corre risco de ser retirada de nós contra a nossa vontade, porque o prefeito decidiu que ele quer pular um semáforo e isso irá resolver o problema do tráfico da região - o que é, de longe, o que vai acontecer após a construção desse túnel. Porque eu digo isso como uma moradora do bairro a minha vida inteira. E esse é um gasto desnecessário aos cofres públicos e uma rota ainda mais desnecessária.
É uma tristeza imensa nos ver sendo tratados como indigentes e, principalmente, por quem deveria ser o nosso apoio. Pois é para isso que o governo existe, para ser em prol do próprio povo e não contra ele.
Essa situação afeta em todos os âmbitos a vida de cada uma dessas mais de 200 famílias. Não somos 75 famílias, como diz no site da prefeitura. É uma vida inteira na região, nossos trabalhos, nossas instituições de ensino, os nossos acompanhamentos médicos.
Não podemos e não queremos sair do nosso bairro por decisão de outras partes, além de estarmos incapacitados de dormirmos. (Isso aqui foi na época que... Porque agora parou a obra por enquanto nessa fase de eleição. Mas, após a gente denunciar no Ministério Público, eles estavam correndo com essa obra durante a madrugada - a gente não estava sabendo o que era dormir... porque eu não sei qual é a pressa em relação a esse projeto. Não faz sentido nenhum, mas, enfim, só para finalizar...)
Espero sair daqui com a certeza de que as medidas compensatórias corretas serão praticadas conforme a lei.
Eu não acho que isso seja exigir muito, já que a lei foi criada pelo próprio governo, e seja mantendo as nossas casas, que é o que as nossas famílias não abrem mão. Seja com a realocação das nossas famílias, no caso de um ultimato que não é o que a gente quer, que a gente vai ser realmente, de fato, retirado em uma unidade habitacional no bairro em que já vivemos por gerações ou a indenização de benfeitorias e compensação financeira suficiente para assegurar o restabelecimento das nossas famílias na região, exigindo-se para esse fim o prévio cadastramento dos mesmos.
Mas que fique claro, a gente não quer que retirem as nossas casas de nós!
Obrigada.Magda Moreira
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